domingo, 24 de abril de 2011

            MARIA MAIS NOVA
(DISCUTE COM ALGUÉM) Será que algum dia eu vou poder seguir o meu caminho em paz? Pára de ficar dizendo como eu devo agir nessa vida! Eu preciso agir do jeito que eu quero. Não quer me apoiar, não apóia, mas não atrasa, tá legal?  Não é porque não deu certo contigo que não vai dar certo comigo.

                                               MARIA
(CANTA UM POUCO MAIS ALTO)

HOMEM
(EM OFF) Nasceu!

MARIA
(SUA MÚSICA É INTERROMPIDA PELA LEMBRANÇA, MAIS FORTE DO QUE ELA. CONTINUA A CONVERSAR COM SUA PRÓPRIA VIDA.) Será médica... geriatra. Isso mesmo, geriatra. Vai cuidar de mim.

MARIA MAIS NOVA
(CONTINUA EM TOM DE DISCUSSÃO) Não vou fazer isso, pai! Como? Você não está sugerindo? Claro que está! Eu preciso é do seu apoio. Já está muito difícil sem você estar contra mim. (TERMINA A DISCUSSÃO E CAMINHA EM DIREÇÃO A UM BALANÇO POSICIONADO EM UMA DAS ESCADAS)

MARIA

Olha só, mulher! Olha como ela sabe escrever direitinho... (EMOCIONADA PELA LEMBRANÇA) Olha como ela faz o “A”... O “E”... Já te disse: se ela não quiser ser médica, vai ser é professora. Vai ensinar a nação a ler e a crescer. Vai contribuir pro futuro do país.

MARIA, AINDA SENTADA NO BANCO DE PRAÇA, FALA OLHANDO EM OUTRA DIREÇÃO. JOÃO ENTRA E A OBSERVA.
                                  
MARIA
Que história é essa de ficar só pensando em namorado? Tão pequenininha. Não tem essa de “deixa pra lá que isso é coisa de criança, não.”

JOÃO

(INTERROMPE MARIA) Namoro só com dezoito anos. E olhe lá! (SENTA-SE AO LADO DE MARIA) Quer fumar? (OFERECE UM CIGARRO A ELA)

MARIA, EMUDECIDA, BALANÇA NEGATIVAMENTE A CABEÇA.

                                   JOÃO
Fuma, moça. É bom! Quando a gente fuma, olha só, (DÁ UM TRAGO. SOPRA A FUMAÇA DE FORMA DEMORADA E PRAZEROSA) parece que os problemas vão embora...

MARIA CONTINUA A OLHAR ESTRANHAMENTE PARA JOÃO. MARIA MAIS NOVA SENTA-SE NO BALANÇO.

                                               JOÃO
Tem certeza de que não quer nem tentar? Hein? Bom, depois não diz que eu não avisei. Se tentasse fumar, diminuiria um pouco essa cara esquisita com que você fica aí, olhando pra tudo.

MARIA SENTE INCÔMODO COM A OBSERVAÇÃO, MAS ACEITA O CIGARRO. DÁ UMA TRAGADA E TOSSE.

                                               JOÃO
Não é bom? Olha só! Já está com uma cara melhor. Meu nome é João; e o seu?

MARIA APERTA A MÃO ESTENDIDA DE JOÃO, MAS É MARIA MAIS NOVA QUE RESPONDE.     

MARIA MAIS NOVA

Maria!


                                   JOÃO

Sabe com que idade eu comecei a fumar, dona Maria? (SEM ESPERAR MARIA RESPONDER). Com quase trinta anos. Bobagem começar tão tarde, não é? Eu nunca peguei num cigarro quando era mais novo. Consegui ficar sem fumar durante toda a adolescência. Até aquele cigarrinho que oferecem quando a gente tem doze ou treze anos... O cigarro da mudança de idade! O cigarrinho da auto-afirmação! Pois é. Nem esse eu fumei.

EM OUTRO TEMPO E LUGAR, MARIA MAIS NOVA PEGA UM CIGARRO E TRAGA.

JOÃO
(IMITA SEU PAI) "Vê se não vai aceitar cigarro na escola não, viu menino?". Era assim que meu pai sempre dizia. E eu não aceitava. (PERGUNTA PARA MARIA) No seu tempo também era assim?

MARIA RESPONDE SORRINDO COM O OLHAR, ENQUANTO MARIA MAIS NOVA CONTINUA A FUMAR OSTENSIVAMENTE. 

MARIA MAIS NOVA
(CONTINUA SENTADA NO BALANÇO, ENQUANTO FUMA). Nãoooo, pai. Eu não fumo maconha. Nãoooo, pai. Eu não uso drogas.

                                               JOÃO
Meu pai era um homem bom. Um homem ótimo.

MARIA

Ótimo pra dar sermão.

                                               JOÃO
Ótimo pra dizer o que era certo e o que era errado.

MARIA MAIS NOVA
Ótimo pra encher o meu saco!

JOÃO

Ótimo para me fazer sentir um perfeito incompetente por não entender metade das coisas que ele dizia.

MARIA MAIS NOVA
(IRÔNICA). “Não chega tarde! Não beija na boca! Não! Não! Não!”

                                               JOÃO
Só sabia proibir. E eu, que sempre fui obediente, fazia tudo direitinho. Sempre fiz tudo o que disseram pra eu fazer.

2 comentários:

  1. Que coisa maravilhosa,falo de tudo,sua volta,sua escrita e sua sensibilidade ao retratar momentos de uma vida,que é nossa de cada dia e pode ser de tantos outros,de uma forma tão intensa e crua,olha,tô muito feliz com isso (e olha que são poucas coisas que me deixam feliz por hoje) eu tô esperando os próximos atos,vamos rumo ao Municipal,hein?! enfim,bela.

    abraço !

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  2. Allan, você é sempre tão generoso e gentil. Queridíssimo, mesmo. OBrigada pela força. Vou continuar, aqui, esperando críticas e leituras de vocês.
    Você sabe que esqueci a senha do solsobre? quero deixar aquele espaço pra publicar outras coisas, pra não confundir. OBRIGADA!!!!!!!!!!
    Um beijo,
    CynthiA

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